Muito além dos pratos típicos e das tradições culinárias do Pará, dois símbolos da biodiversidade amazônica estão ganhando espaço em um campo inesperado: o consultório odontológico. Jambu e açaí, ingredientes conhecidos mundialmente por suas propriedades sensoriais e antioxidantes, foram protagonistas de pesquisas desenvolvidas no Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Universidade Federal do Pará (UFPA), com resultados promissores na saúde bucal.
A pesquisa da doutoranda Brennda Lucy Freitas de Paula investigou o potencial do jambu no alívio da sensibilidade dentária após clareamentos, problema comum nos consultórios. A tese, inédita no país, desenvolveu um gel experimental à base do extrato purificado de Acmella oleracea, que bloqueia os canais de dor presentes na polpa dental — o mesmo efeito que causa a conhecida dormência ao mastigar a folha. O estudo passou por diferentes etapas, desde testes celulares e laboratoriais até ensaios clínicos com voluntários, e mostrou que o uso do jambu pode representar uma alternativa natural e eficaz aos tratamentos convencionais.
Já a dissertação de Zuleni Alexandre da Silva focou no uso do açaí clarificado como agente complementar no tratamento da periodontite, inflamação que pode levar à perda dentária se não tratada adequadamente. Utilizando um modelo experimental com ratos, a pesquisa demonstrou que o açaí melhora os parâmetros antioxidantes do organismo e ajuda a modular o processo inflamatório, abrindo caminho para terapias naturais associadas ao tratamento tradicional de raspagem e alisamento radicular.
Os dois estudos têm em comum a valorização dos saberes tradicionais amazônicos aplicados à ciência. Segundo as pesquisadoras, o potencial dos fitoterápicos — medicamentos derivados de plantas — está apenas começando a ser explorado na odontologia. “Queremos ir além do que já existe e oferecer soluções mais confortáveis e eficazes aos pacientes”, afirma Brennda.
Embora ainda em fase inicial, as pesquisas representam um marco na inovação odontológica e evidenciam como a biodiversidade amazônica pode contribuir para tratamentos mais eficazes e acessíveis. Próximas etapas incluem estudos clínicos em larga escala e o desenvolvimento de produtos viáveis para uso comercial, o que pode transformar o jambu e o açaí em protagonistas de uma nova geração de terapias naturais.