“Demons”: um apocalipse demoníaco e exageradamente divertido

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 um apocalipse demoníaco e exageradamente divertido

Uma das mais criativas expressões do cinema de horror italiano produzido nos anos 1980, “Demons – Filhos das Trevas” envolve o espectador em uma atmosfera de pesadelo, fazendo uso de cores vibrantes e violência extremamente gráfica para criar uma sensação claustrofóbica e de puro terror. Além disso, lançar mão da fórmula do “filme dentro do filme” amplifica essa experiência sensorial do público, traçando um paralelo perspicaz com o que Fellini costumava pregar, de que “o cinema é o modo mais direto de entrar em competição com Deus”. Ora, quer competição mais acirrada do que, a partir desse cinema, mergulhar o mundo em um apocalipse demoníaco?

Esse caráter metalinguístico do longa gera uma identificação imediata do público com os seus personagens. Trata-se de um grupo de pessoas que recebe um folheto, distribuído por um sinistro homem de preto com uma máscara de metal que cobre parcialmente o seu rosto, com um convite para uma sessão em um antigo cinema recentemente restaurado. O grupo assiste a um filme de terror e tudo o que acontece na tela é reproduzido na vida real, causando uma possessão demoníaca e sua propagação a partir do contato: mordidas, lacerações, pústulas, banhos de sangue etc. Algo nos moldes de “Evil Dead”, uma clara inspiração, o que justifica o estilo visceral – e galhofeiro – sobrepondo-se ao onírico em vários momentos.

Não que a metafísica não esteja presente. Afinal, tudo começa a partir do uso de uma máscara, o que sempre guarda um simbolismo. Ela está exposta no cinema, junto de uma espada samurai e uma motocicleta (?!), sendo a mesma que o homem de preto usava e que também surge no filme dentro do filme. Seria, portanto, uma sugestão de que o homem de preto seria, na realidade, um daqueles personagens “fictícios”, com sua humanidade, de alguma forma, recuperada. Por fim, a máscara teria relação com uma profecia de Nostradamus sobre a invasão da Terra por demônios: “Eles farão dos cemitérios suas catedrais e as cidades serão suas tumbas”, trazendo consequências funestas para quem a colocar. Ou seja, ela seria uma ponte entre o mundo visível e o espiritual. Portal este que, agora, está aberto.

O misterioso homem de preto: agente do caos

A partir daí, o poder imagético de “Demons” se mostra impressionante. Os olhos brilhantes e ameaçadores dos possuídos, que vão surgindo em meio à luz azul do projetor cinematográfico, para continuar sua perseguição às vítimas, é uma pintura hipnótica. Assim como as cortinas vermelhas do cinema que guardam uma homenagem a Dario Argento e seu “Suspiria”, na forma como sugerem o perigo que cercam os personagens. Isso sem contar a cena em que, por trás da tela, uma mulher se transforma enquanto outra tenta sobreviver na “ficção”. Essa sobreposição de gritos e sofrimento resulta em uma tensão incontrolável para quem assiste – aqui na vida real e lá.

Essas cenas, contudo, não ditam o tom. Afinal de contas, na maior parte do tempo, o espírito é caótico e o que reina é, de fato, o grotesco, o gore e a simples diversão, descompromissada até mesmo de uma lógica narrativa. Dessa forma, “Demons” deixa todos aqueles momentos de sutileza de lado e aposta na estética do exagero. Ei, eram os anos 1980. Assim, o filme combina a trilha sonora heavy metal criada por Claudio Simonetti, com direito ainda a Billy Idol, Saxon e Accept, por exemplo, aos clássicos efeitos práticos em que o sangue jorra e a maquiagem traz os possuídos como criaturas gosmentas e putrefatas. Um trabalho excepcional do diretor de efeitos especiais Sergio Stivaletti, diga-se. Mas não só dele. O filme só não desanda porque a nata do cinema de horror italiano se faz presente, com o próprio Argento no roteiro e produção; Dardano Sacchetti e Franco Ferrini (roteiro); Gianlorenzo Battaglia (diretor de fotografia); e, claro, Lamberto Bava (filho do mestre Mario Bava) na direção. Eles conduzem todo esse caos com maestria.

Demônios à solta no cinema

E o filme vira mesmo uma sucessão de ideias e situações que jamais levam em consideração a coesão e a coerência. Mas, entre tudo o que acontece, até mesmo a solução improvável – totalmente “Deus Ex Machina” – no final para a saída do cinema, a única decisão realmente condenável é a inclusão da subtrama dos delinquentes, que não agrega em nada e ainda quebra o ritmo do filme. O fato dele ser curto (88 minutos) é um agravante. Essa subtrama poderia muito bem ter sido substituída por mais tempo de tela da história e motivações do homem de preto/Jerry, um personagem certamente bem mais interessante. De qualquer forma, nada que atrapalhe esta distopia infernal, nojenta e estilosa. Entretenimento de primeira qualidade.

Onde assistir

  • “Demons – Filhos das Trevas” está disponível para streaming na Darkflix e no Cultpix, além de ter cópia disponibilizada no YouTube.
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