Pesquisa que explica como o corpo evita se autodestruir ganha Nobel de Medicina. Entenda!

há 2 dias 7

Três pesquisadores, os americanos Mary E. Brunkow e Fred Ramsdell e o japonês Shimon Sakaguchi, foram premiados com o Nobel de Medicina de 2025 por elucidar um dos maiores mistérios da biologia: o mecanismo que impede o sistema imunológico de atacar o próprio organismo.

O trio foi responsável por desvendar os processos que sustentam a chamada tolerância imune periférica, um sistema de “freios” que diferencia tecidos saudáveis de agentes invasores. As descobertas abriram caminho para avanços em tratamentos contra o câncer, doenças autoimunes e também para o aumento da taxa de sucesso em transplantes de órgãos. Atualmente, várias terapias inspiradas nesse trabalho estão em fase de testes clínicos.

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 Reprodução/Nobel Prize
Vencedores do Nobel da Medicina Mary E. Brunkow, Fred Ramsdell and Shimon SakaguchiFoto: Reprodução/Nobel Prize
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Vencedores do Nobel da Medicina Mary E. Brunkow, Fred Ramsdell and Shimon SakaguchiFoto: Reprodução/Nobel Prize
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O prêmio, de 11 milhões de coroas suecas (equivalentes a cerca de R$ 6,2 milhões), foi anunciado nesta segunda-feira (6/10) pela Assembleia do Nobel no Instituto Karolinska, em Estocolmo.

As “guardiãs” do sistema imune

O estudo liderado pelos cientistas revelou por que o sistema de defesa do corpo humano, apesar de ser altamente destrutivo, não volta suas armas contra si mesmo. O segredo está em um tipo específico de célula imune — as chamadas células T reguladoras — que atuam como “guardiãs” do equilíbrio biológico, evitando que os linfócitos ataquem órgãos e tecidos saudáveis.

“Essas descobertas foram decisivas para compreendermos como o sistema imunológico funciona e por que nem todos desenvolvemos doenças autoimunes graves”, declarou Olle Kämpe, presidente do Comitê Nobel de Medicina.

A contribuição de Shimon Sakaguchi foi um ponto de virada. Em 1995, o pesquisador demonstrou que o controle imunológico não dependia apenas da eliminação de células defeituosas no timo — mecanismo conhecido como tolerância central —, mas também da ação contínua de células que regulam a resposta imune. Essas foram as T reguladoras.

Seis anos depois, em 2001, Mary Brunkow e Fred Ramsdell identificaram o gene FOXP3, essencial para a formação dessas células. A descoberta ocorreu a partir do estudo de uma síndrome autoimune severa, o IPEX, causada por mutações nesse gene. Dois anos mais tarde, Sakaguchi comprovou que o FOXP3 era o “comando central” responsável por ativar as células reguladoras que ele havia descrito.

Juntas, essas pesquisas deram origem a um novo campo da imunologia — o da tolerância periférica — e pavimentaram o caminho para terapias inovadoras que hoje avançam do laboratório para a prática clínica.

Um sistema de defesa sob vigilância constante

O sistema imunológico é uma rede complexa, projetada para combater patógenos e manter o equilíbrio do organismo. No entanto, quando essa regulação falha, as defesas se voltam contra o próprio corpo, originando doenças como lúpus, artrite reumatoide ou diabetes tipo 1.

Durante muito tempo, acreditou-se que a proteção contra esse tipo de erro vinha apenas da eliminação, no timo, das células potencialmente perigosas. Mas Sakaguchi e, depois, Brunkow e Ramsdell mostraram que o corpo também possui um segundo nível de controle — um exército de “supervisores” que mantém o sistema imune sob constante vigilância.

A partir do gene FOXP3, os cientistas entenderam como as T reguladoras são formadas e de que forma agem para evitar ataques indevidos. A descoberta mudou para sempre a compreensão sobre o funcionamento do sistema imune humano.

Caminhos para novas terapias

As implicações clínicas dessas descobertas são vastas. Estudos atuais buscam maneiras de estimular as células T reguladoras para frear doenças autoimunes e, ao mesmo tempo, encontrar formas de inibi-las em casos de câncer, já que alguns tumores se aproveitam desse mecanismo para escapar da detecção pelo sistema de defesa.

Ensaios clínicos em curso testam, por exemplo, o uso da interleucina-2, uma molécula capaz de aumentar a proliferação dessas células, em pacientes com doenças autoimunes e receptores de transplantes. Outras linhas de pesquisa apostam em terapias personalizadas, com células T reguladoras cultivadas em laboratório e reinfundidas nos pacientes para controlar inflamações severas.

Segundo o Comitê Nobel, com essas descobertas, “os laureados lançaram as bases para o desenvolvimento de tratamentos que podem beneficiar milhões de pessoas”.

Os premiados

Mary E. Brunkow, nascida em 1961, doutorou-se pela Universidade de Princeton e hoje atua como gerente de programas sênior no Institute for Systems Biology, em Seattle (EUA).

Fred Ramsdell, nascido em 1960, obteve seu doutorado na Universidade da Califórnia (UCLA) e é atualmente consultor científico da Sonoma Biotherapeutics, em San Francisco, empresa dedicada a terapias celulares voltadas a doenças autoimunes.

Shimon Sakaguchi, nascido em 1951, é médico formado pela Universidade de Kyoto e professor emérito do Immunology Frontier Research Center, da Universidade de Osaka. Reconhecido como um dos maiores nomes da imunologia moderna, ele é considerado pioneiro no estudo da tolerância imunológica.

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